Nesta semana, convido vocês a uma reflexão sobre dois termos frequentemente confundidos no universo da dança, especialmente quando falamos sobre os métodos de ensino do balé clássico: "método" e "metodologia". Embora possam parecer sinônimos à primeira vista, eles têm significados distintos e implicações diferentes na prática pedagógica.
O método refere-se a um conjunto específico de técnicas e práticas que orientam o ensino e a aprendizagem. Por exemplo, ao discutirmos os métodos Vaganova, Royal ou Cubano, estamos nos referindo a abordagens concretas que delineiam como o balé deve ser ensinado e praticado. Cada um desses métodos carrega suas próprias características, fundamentos e objetivos, moldando a formação dos bailarinos de maneiras únicas.
Por outro lado, a metodologia é um conceito mais amplo que abrange a filosofia e os princípios que sustentam a escolha e a aplicação de um ou mais métodos. Trata-se de uma reflexão crítica sobre como e por que determinados métodos são utilizados no ensino da dança. A metodologia leva em consideração contextos sociais, culturais e pedagógicos, permitindo que educadores adaptem suas abordagens de acordo com as necessidades dos alunos e as especificidades do ambiente de aprendizagem.
“princípios que sustentam a escolha e a aplicação de um ou mais métodos.”
Em minha formação, tive acesso a três diferentes métodos de ensino: Vaganova (de origem russo), Royal Academy of Dance (inglês) e o método Cubano. O estudo deles e minhas inquietações enquanto bailarina ao conviver com três diferentes tipos de aula fez com que escrevesse para meu trabalho de conclusão de curso da Pós-Graduação em Dança uma monografia que se transformou, 10 anos depois, em meu primeiro livro publicado: "Ballet: métodos e corpos". Por essa razão, vou me ater aqui apenas a exemplificações através desses 3 métodos.
Método Vaganova
De forma ampla, este método, desenvolvido por Agrippina Vaganova, enfatiza a importância da expressividade junto ao rigor técnico. O resultado corporal nos bailarinos é de uma técnica conhecida por suas linhas suaves e fluidas, com um forte foco na postura e no alinhamento do corpo. Os exercícios são organizados de forma a desenvolver tanto a força quanto a flexibilidade. Os bailarinos que se formam nesse método costumam ter uma forte conexão emocional com a dança, o que é vital para performances de balé clássico que exigem interpretação.
Método RAD (Royal Academy of Dance)
Originado a partir do estudo de quatro outros métodos já existentes, esse é amplamente utilizado em todo o mundo e foca numa formação ampla dos bailarinos (para além da técnica), com uma abordagem sistemática e estruturada. A formação inclui uma série de exames (de conteúdo pré-determinado e igual em todo o mundo) que avaliam o progresso dos alunos, promovendo um ambiente de aprendizado claro e objetivo. Os bailarinos formados nesse método tendem a ter uma técnica muito sólida, pois ele enfatiza a correção técnica e a precisão dos movimentos.
Método Cubano
Este método, originado a partir de um estudo do método Vaganova para aplicação no corpo do bailarino latino, é conhecido por sua forte influência da cultura caribenha e pela ênfase em ritmos e musicalidade. O método cubano se destaca pela sua abordagem forte e expressiva, integrando elementos de dança contemporânea e folclórica, o que enriquece a formação dos bailarinos, principalmente para os saltos e giros. Os bailarinos cubanos são frequentemente elogiados por sua musicalidade e capacidade de girar, saltar e improvisar, habilidades que são cada vez mais valorizadas no cenário da dança contemporânea.
A Importância da Metodologia
A metodologia não se trata apenas da escolha do método, mas também sobre entender o "porquê" por trás dessa escolha. Por que um educador optaria por um método em vez de outro? Como isso se alinha com os objetivos de aprendizagem dos alunos? É através do pensar da metodologia que os educadores consideram fatores como a diversidade dos alunos, suas experiências prévias e suas necessidades específicas. Isso é fundamental para criar um ambiente de ensino inclusivo e eficaz.
Uma abordagem metodológica sólida também envolve a avaliação contínua dos resultados dos métodos utilizados. Isso pode incluir feedback para os alunos, autoavaliação dos professores e a adaptação dos métodos conforme necessário.
Os métodos e a metodologia estão intrinsecamente ligados. Enquanto os métodos fornecem as ferramentas e técnicas, a metodologia orienta como e por que essas ferramentas são utilizadas. Um educador eficaz deve ser capaz de navegar entre ambos para maximizar o potencial de aprendizado dos alunos. Compreender essa conexão pode levar a uma transformação no ensino do balé clássico, permitindo que os educadores se tornem mais reflexivos e críticos em sua prática. Isso não apenas beneficia os alunos, mas também enriquece a própria disciplina da dança.
Ao compreendermos bem as diferenças entre método e metodologia, podemos avançar para um ensino de dança mais consciente e adaptável.
É comum que professores e escolas de dança acreditem que a simples definição do método de ensino — seja Vaganova, Cubano, Royal, Cechetti, Francês… — seja suficiente para garantir uma formação de qualidade. No entanto, é fundamental reconhecer que a escolha do método ou métodos utilizados é apenas um primeiro passo dentro de um espectro metodológico muito mais amplo. Limitar-se apenas à escolha do método pode resultar em uma abordagem rígida e desatualizada, que não considera as necessidades individuais dos alunos ou as dinâmicas do contexto educacional.
Um verdadeiro compromisso com a educação da dança exige uma reflexão constante sobre como esses métodos são aplicados, adaptados e integrados a uma metodologia que valorize a diversidade, a criatividade e o desenvolvimento integral dos bailarinos. Dessa forma, o educador se torna não apenas um transmissor de técnicas, mas um facilitador do aprendizado, capaz de inspirar e moldar a próxima geração de artistas.
Lembremos sempre que a dança é uma arte viva, e a forma como ensinamos e aprendemos deve refletir essa vitalidade e diversidade.
Indico fortemente a leitura do livro “Métodos do Balé Clássico - História e Consolidação” da autora Caroline Konzen Castro para um maior entendimento sobre a estruturação dos métodos.